domingo, 7 de dezembro de 2008

Como vê, Ramiro, os 34 anos de democracia não foram suficientes para educar todo o povo

O professor Ramiro Marques do ProfAvaliação (um dos melhores blogues do país sobre temáticas educativas) escreveu um post sobre a posição dos Presidentes dos Conselhos Executivos com assento no Conselho das Escolas. Veja aqui. Também já tinha escrito sobre essa matéria aqui.

A história é muito simples e pode ser contada da seguinte forma:

1 - A maioria dos membros do Conselho das Escolas decidiu propôr à Ministra da Educação a suspensão do modelo de avaliação.

2 - Alguns dos elementos que votaram contra esta decisão resolveram declarar as suas razões em acta. Ou seja, alguns dos elementos que votaram contra a suspensão quiseram que se soubesse que tinham votado contra e quais as razões porque o fizeram.

3 - O presidente do órgão resolveu entregar à Ministra da Educação essa decisão.

4 - Decidiu escrever um ofício, ou lá o que é, no qual, bem embrulhada e escondida, colocou a decisão do Conselho, o nome dos proponentes e o nome dos que, votando contra a mesma, apresentaram declaração de voto. E foi isto que se passou. E não haveria mais história para contar.

Eis senão quando, mal se tornaram públicos os nomes de alguns dos Presidentes dos Conselhos Executivos que votaram contra a suspensão, choveram algumas vozes verberando essa publicitação. Que era "inqualificável"; que tinha aberto "a caça"; "inquisição"; "bufaria", etc. Uma tal de Isabel até ficou envergonhada! Não sei se por levantar a saia mas, enfim, corou.
Ontem, por interposta pessoa, o professor deu uma liçãozinha sobre regras de cidadania, publicando um acertado texto de Cristina Ribas (que desconheço) sobre o mesmo assunto, do qual retiro duas coisas óbvias para aqueles que receberam alguma educação e menos óbvias para aqueles que têm o cérebro boto:

"Todos nós temos direito a ter opiniões diferentes sobre as coisas e sobre as situações mas também temos o direito de sermos honestos uns com os outros. Que haja clareza! Que haja verdade! Esse é um dos princípios fundamentais de cidadania".

"Além disso, um outro aspecto, uma declaração de voto é uma tomada pública de decisão. Quando estamos a fazer uma declaração de voto estamos a dizer publicamente que nos demarcamos de uma determinada situação, até porque se houver consequências legais de uma determinada deliberação, não somos abrangidos por ela, é uma declaração pública. É como dizer "Eu não tenho nada a ver com isso".

As regras de cidadania que este episódio (não confundir com os episódios da novela desgraçada do Director-geral) nos recorda são as seguintes:
- Todos têm o direito a pensar pela sua cabeça e a caminhar pelos seus pés.
- Todos têm o dever de ser honestos consigo e com os outros.
- Uma declaração de voto é, por definição, uma declaração pública.
- Os que declararam o voto quiseram que o público (aqueles que não estavam presentes na reunião) soubesse o sentido do seu voto e as razões porque votaram dessa forma e não de outra.
- As escolas têm o direito de saber as posições que tomam aqueles que elegeram para as dirigir
- Nenhum membro de um órgão multipessoal pode querer esconder as suas responsabilidades atrás de uma votação "colectiva". Não há nada que não se saiba.
- A publicitação da acta do Conselho das Escolas por vários blogues favoreceu os que votaram contra a suspensão do processo de avaliação e que declararam o voto pois, os PCE de todas as escolas do país ficaram a saber como pensam aqueles 10 representantes seus.
- Os PCE que declararam o voto foram ainda beneficiados pela divulgação do documento pois chegou ao conhecimento público aquilo - a forma como votaram o assunto - que lhes interessava fosse público.

Claro que, para alguns portugueses, estas regras não entram à primeira e precisarão de umas aulitas de recuperação; outros há que as percebem muito bem mas disfarçam...

"Há três espécies de cérebros: uns entendem por si próprios; os outros discernem o que os primeiros entendem; e os terceiros não entendem nem por si próprios nem pelos outros; os primeiros são excelentíssimos; os segundos excelentes; e os terceiros totalmente inúteis". Maquiavel


Não cobro nada por esta lição. No entanto, a matéria da próxima aula já fica dada.
Reitor

7 comentários:

  1. Grande lição de cultura democrática... que alguns tomam para si próprios , desde que ninguém saiba... afinal se sentem enverginhados, alguma coisa se passa... deviam votar , não conforme a sua consciência, que a não têm, mas como se tivessem as câmaras de vigilância sobre si, que também já as há , por esse país, por esses corredores fora... por enquanto nos corredores...
    Grande lição, sim senhor ...

    ResponderEliminar
  2. “Há três espécies de cérebros: uns entendem por si próprios; os outros …"

    Magister dixit. Uma voz. Única.

    Encontrado no blogue do MUP e que transcrevo para aqui (com alguma adaptação):

    «"O mundo segue enfrentando um recrudescimento das manifestações de intolerância e de exclusão que se alimentam da precariedade de ideias* e das pandemias. Temos que trabalhar em favor de uma cultura de tolerância mútua, activa e combativa, com a finalidade de prevenir novas tragédias", afirma Matsuura, Director-Geral da UNESCO.

    *pensamento meu

    Importaria promover os valores do pluralismo, do respeito à diversidade e a não discriminação, na tentativa de construir uma cultura de tolerância mútua. Não é o caso.

    “Porque não é apenas o interesse que leva os homens a matarem-se mutuamente. É também o dogmatismo. Nada é tão perigoso como a certeza de se ter razão. Nada causa tanta destruição como a obsessão duma verdade considerada absoluta. Todos os crimes da história são consequência de algum fanatismo. Todos os massacres foram cometidos por virtude, em nome da verdadeira religião, do nacionalismo legítimo, da política idónea, da ideologia justa; em suma, em nome do combate contra a verdade do outro.”
    JACOB, François - O jogo dos possíveis, p.10-11



    Importa o diálogo.
    (…) o diálogo permite as diferenças e, ao mesmo tempo, cria uma zona em que as alteridades coexistem e se entretecem. Como o diálogo excluiu o ultimatum, é uma renúncia aos absolutos e às suas despóticas pretensões de totalidade: nós somos relativos e é relativo o que dizemos e o que ouvimos. Porém, este relativismo não é demissão: para poder haver diálogo temos de afirmar o que somos e, simultaneamente, reconhecer o outro em toda a sua irredutível diferença. O diálogo impede-nos de nos negarmos e de negarmos a humanidade do nosso adversário. (…) O diálogo não é senão uma das formas, porventura a mais elevada, da simpatia cósmica." Octávio Paz

    “Enquanto não alcançares a verdade, não poderás corrigí-la. Porém, se a não corrigires, não a alcançarás.”
    Do Livro dos Conselhos, da epígrafe que José Saramago escolheu para a sua História do Cerco de Lisboa.»

    A lembrar alguns dos não diálogos da nossa Humanidade:

    Sodoma e Gomorra
    Atenas vs Esparta (Guerra do Peloponeso)
    Roma vs Cartago (Guerras púnicas)
    Cruzadas (Cristãos vs Muçulmanos)
    Ocidente vs Oriente
    Hemisfério Norte vs Hemisfério Sul
    Guerra da Barba (França – Inglaterra, séc. XII)
    Galileu Galilei vs Tribunal do Santo Ofício
    Guerra das Rosas (Inglaterra, séc. XV, Casa de York vs Casa de Lancaster)
    Guerra Irão-Iraque (1980-1988)
    Guerra dos Balcãs (Sérvia, Montenegro, Grécia, Roménia, Turquia, 1912-1913)
    Israel vs Palestina

    ResponderEliminar
  3. Obrigado, Reitor. Grande post. A provar, mais uma vez, que se encontra neste blog alguma da escrita mais inteligente sobre temas educativos.

    ResponderEliminar
  4. A aula até nem está mal dada. Ligeiramente desactualizada diria eu. Ao tempo Maquiavel, ainda não vislumbrava um quarto tipo: o dos que querem que os segundos percebam de preferência sem lhes darem hiótese de pensarem. É a espécie também conhecida por "Os chicos espertos".

    ResponderEliminar
  5. Como?

    O blog do Ramiro é Bom?

    O homem nem escrever sabe.

    ResponderEliminar
  6. “ ramiro disse...
    Obrigado, Reitor. Grande post. A provar, mais uma vez, que se encontra neste blog alguma da escrita mais inteligente sobre temas educativos.”

    Pergunto: que temas educativos? Veja-se a relação dos posts de Dezembro e dos últimos de Novembro:

    Começou hoje, oficialmente, a caça ao voto
    Cortar Com Bisturi
    Como vê, Ramiro, os 34 anos de democracia não foram suficientes para educar todo o povo
    Ali Nasceu Portugal
    Por uma vez que seja, tens razão!
    Aleluia! Parece que chegou o juízo!
    Dia após dia, a corda cede...
    Não Percebeu Nada, Jacinta!
    Chantagista Pago Pelo Estado
    Tss! Tss! Só o Sexto?
    Palavras Ocas, Discursos Grandiloquentes
    Resumo Numa Frase Da Política Educativa do P.S.
    Todos os dias temos de lutar pela LIBERDADE. No dia 3 também
    Contra-Vapor
    Cadê os restantes 10?
    Top-Secret: A Deliberação Que Tardava
    RADIONOVELA "A DESGRAÇADA" - O mistério, a paixão, a violência, o sexo... (3)
    O Último Arrebanhamento
    APRENDE A NADAR, COMPANHEIRO
    É política! É propaganda!
    Lotaria de 25.000 euros, com os nossos impostos...
    Só faltava mais esta!
    O que faz falta é avisar a malta!
    Ou seja, a avaliação que existia antes
    Hã! Como dizes?
    A Caixinha de Pandora
    Eu, Socialista, Me Confesso
    Hipocrisia, Falsidade, Simulação
    Tudo na mesma
    Onde foi que já ouvimos isto?


    Não descortino nenhum tema, nenhuma questão educativa. Ou um Doutor em Educação, na especialidade de desenvolvimento curricular, com uma tese sobre “educação para os valores no ensino básico” (1991), não reconhece os não valores que neles se plasmam?

    ResponderEliminar
  7. Olha, olha...
    Que interessante.
    O Anónimo das 16h53 quer diálogo...
    E o das 22h11 quer avaliar os "valores que neles se plasmam"
    Esperem um pouco que já lá vamos.

    ResponderEliminar