domingo, 25 de julho de 2010

As Dores de Parto de Uma Notória, Ainda Que Lenta, Viragem à Direita

Paulo Guinote é um lúcido analista e um nome de respeito na produção de ideias e de opinião na blogosfera. Desconfio que deve ser, também, um excelente professor. Mesmo não tendo sido avaliado com Excelente...
Dito isto, o professor Guinote não tem o direito de incomodar um português em merecido gozo de férias e que, apenas esparsamente e à noitinha, pega na arma para dar uns tiritos a uns pardais que por aí deixam umas caganitas secas.
Não tem o direito de incomodar, mas incomodou. Com um desaforado postezito que deixou aqui.

Indo directo ao assunto...

A Constituição portuguesa é uma mentira pegada. É só treta e falsidade. E está cheia de limitações à liberdade do povo. Do actual.
É uma falsidade absoluta que a educação e a saúde sejam tendencialmente gratuitas. Pelo menos, desde a aprovação da primeira Constituição em democracia, os portugueses pagam mais pela educação e pela saúde. José Manuel Fernandes escreveu um texto de antologia, no PÚBLICO e no Blasfémias, onde explica tudo. Está aqui.

O primeiro equívoco - do Paulo - está na identificação - errada - das "posições em confronto".
Nem o Estado precisa de alargar a oferta pública, nem os privados precisam de aumentar a sua oferta, nem precisam de ser subsidiados, nem os cidadãos precisam de cheques-ensino, nem é preciso atirar com o papão neoliberal para vincar bem o que está verdadeiramente em confronto.
O que está em confronto são duas ideias de sociedade: por um lado, a defesa de uma sociedade aberta, de cidadãos livres que recusam ser aferrolhados por uma Constituição palavrosa e absurda que, ao mesmo tempo que defende a liberdade de ensinar e aprender, impõe que o Estado detenha o monopólio do ensino. Do outro lado, a defesa de uma sociedade fechada, cujos cidadãos são tutelados pelo Estado e empurrados -pela tirania do nº da porta - para escolas de má qualidade e para péssimos serviços de saúde, apenas porque são serviços públicos.
O que está em causa é, por um lado, uma sociedade esclarecida de cidadãos capazes de tomar decisões e de se responsabilizar por elas e, por outro, uma sociedade de cidadãos conformados às decisões de uns quantos mangas-de-alpaca que, em nome do Estado (em seu próprio nome, afinal), lhes escolhem a escola dos filhos e o médico de família. Tal como há ainda pouco tempo lhes escolhiam os programas televisivos que deveriam ver.
A bem do rigor, há uma minoria de portugueses que já se libertou do jugo estatal na saúde. Os felizardos funcionários públicos estão isentos de frequentar as casas de saúde do próprio Estado. São livres de escolher o seu médico. Repare-se: o Estado obriga o comum dos portugueses a utilizar os serviços públicos de saúde mas dá liberdade aos seus funcionários - portugueses de primeira - para escolherem serviços privados se assim o entenderem.

O Guinote também erra fragorosamente na identificação da realidade concreta.
Em concreto, o que se tem passado é isto: o Estado está-se borrifando para a educação e para a saúde dos portugueses. Fecha-lhes maternidades e centros de saúde; fecha-lhes escolas e dificulta-lhes o acesso à educação. E, ainda por cima, faz todo este mal dizendo que é para bem dos cidadãos.

A realidade mostra que o número de alunos no privado tem vindo a aumentar por comparação com o sector público.
A realidade diz-nos - sem necessidade de qualquer estudo - que em cada 10 portugueses a quem fosse dado escolher se preferiam uma escola pública ou uma escola privada para educar os filhos, muito provavelmente teríamos aí uns 8 a escolherem a privada.
A realidade diz-nos que os políticos e os poderosos destes país - que podem fazer todo o mal do mundo mas que sabem muito bem governar-se e proteger os seus interesses - colocam os filhinhos nas escolas privadas. Por alguma razão será, não?
A realidade é que os cidadãos portugueses preferem um Estado paternalista que os tutele e lhes trate da vidinha a uma Estado que os trate como cidadãos livres.

Os equívocos no meio disto tudo, não são os que o Paulo apresenta. Esses são só fumaça. Os verdadeiros equívocos são estes:
1 - Ao Estado compete assegurar-se de que todos os cidadãos têm acesso à educação. E não o faz devidamente.
2 - O Estado só pode assegurar o direito à educação dos portugueses financiando individualmente a educação de cada um e não financiando as escolas ou construindo escolas.
3 - O financiamento da educação dos portugueses pode ser feito tal como é feito o financiamento da saúde do Paulo e dos restantes funcionários públicos (sem cheque e sem subsídio. Apenas comparticipando o serviço prestado, independentemente de por quem ou onde é prestado).
4 - A iniciativa privada na educação não precisa de subsídios nem de esmolas. Precisa apenas que se lhe pague o serviço que presta. E digo-lhe mais: pode ser pago a 80% dos custos que o mesmo serviço tem no Estado que ainda tem lucro.
5 - O grande equívoco do nosso tempo - e que equivoca mesmo os mais lúcidos - está naquilo que José Manuel Fernandes sintetizou numa expressão feliz: o "povo" de 1975 manda mais que o "povo" de 2010.

Mas as coisas estão a mudar, lentamente. Até para o Paulo Guinote que já diz aquilo que dificilmente diria há 3 anos atrás:

Sou o mais favorável possível ao aparecimento de propostas privadas na área da Educação

Ah! Meu caro. Os gritos que ouves não são gritos de reivindicação para que o Estado financie a iniciativa privada. Tu sabes muito bem os gritos que se ouvem são alertas para que o Estado financie a educação dos seus cidadãos menores (os maiores que vão trabalhar) e não as escolas - privadas ou públicas.

E, faz favor, não escrevas nada fracturante até aos dia 15/08. Obrigado.

Reitor

1 comentário:

  1. Um texto cheio de equívocos - acho eu - porque andamos todos um bocado cansados e por vezes baralhamo-nos.

    Se a Constituição é uma ficção como é possível que nos aferrolhe?

    Quanto às posições em confronto, como se percebe, não as associo a crenças daquelas muito fortes.
    Até ousaria dizer que são coreografias como as do actual ME com os sindicatos.

    Mas realmente isto é demasiado "espesso" para debatermos agora.

    Abraço, boas férias, que eu ainda as não tenho...

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