domingo, 11 de fevereiro de 2007

Mais te valia estar calado

Gosto de ler o Miguel Sousa Tavares (MST).
Especialmente quando escreve sobre regionalização e autarcas...tem artigos fabulosos sobre esta temática.
O Miguel não é infalível, às vezes não tem razão e outras põe mesmo o pé na poça como, por exemplo, no feio artigo “Aborto, mentiras e vídeo” que escreveu no Expresso de 6ª feira, dia 09/02/2007.
Neste lamentável artigo de propaganda pelo sim ao aborto, MST mostra bem como a inteligência e o discernimento podem ficar perturbados quando emitimos opinião sobre causa em que temos interesse. Vamos ver:
1 - MST chama malabaristas aos juristas, alguns de nomeada como o ex-ministro socialista - Diogo Freitas do Amaral - que defendem ser possível o aborto sem crime e a mulher que aborta poder não ser penalizada judicialmente. Esta opinião é demasiado radical para uma articulista que se quer isento.

2 - MST é infeliz e, mais uma vez, radical quando afirma que o argumento financeiro avançado pelo António Borges é "chocante do ponto de vista político, humano e até cristão". Vejam bem, o "cristão" MST fica chocado com um argumento destes. E fica chocado porquê? Não porque tenha de esperar anos por uma cirurgia, meses por uma consulta, ou porque tenha de fazer fila durante horas nas urgências de muitos hospitais públicos. Não. MST parece ser daqueles que pode marcar consulta na hora e cirurgia para amanhã! Por isso é que acha chocante que o Estado, que tem por obrigação tratar dos doentes e dos enfermos - e trata deles muito mal e a más horas, pelo que se vê e ouve - vá agora utilizar os meios humanos, materiais e financeiros ao seu dispor para interromper gravidezes que decorrem normalmente em mulheres saudáveis. E assim eliminar fetos que são, indiscutivelmente, seres humanos em desenvolvimento.

3 - MST não poupa uma "pequena" falsidade para ajudar a sua argumentação. Vejam lá: "a questão da vida ou não vida do feto até às dez semanas, como se percebeu escutando os argumentos de ambos os lados, é muito mais filosófica e religiosa do que científica". Duplamente falso: a) porque não se ouviu nada disto escutando ambos os lados - mesmo aos defensores do sim nunca se ouviu dizer que um feto com dez semanas não era um ser vivo; b) porque não deve haver ninguém no mundo civilizado - cientistas ou não cientistas - que negue que um feto com dez semanas é um ser humano em desenvolvimento (ou seja é, indiscutivelmente, um ser vivo e, mais que isso, um ser humano). Por aqui se vê que, até os grandes jornalistas podem não ser sérios quando escrevem sobre temas de que perfilham uma posição.

4 – Mas há pior e, até, repugnante: MST diz que se deveria equacionar o direito de uma criança não vir ao mundo quando aquilo que a espera é uma vida indigna e miserável. E para dar como boa a sua tese, junta os abusos sexuais de pais sobre os filhos e filhos assassinados e escondidos ou mortos à pancada. Remata dizendo que há pais que nunca o deveriam ter sido.
Acho estas teses do MST, que respeito e de cuja escrita gosto, miseráveis pela vilania que transportam. Primeiro, porque mistura alhos com bugalhos, ou seja, se de facto há pais que nunca o deveriam ter sido e é verdade, esse facto nada tem a ver com o aborto, nem de longe nem de perto. O direito do feto à vida vale por si e não pelo que são ou por quem são os respectivos pais.
Pela parte que me toca, se fosse obrigado a escolher entre aplicar a pena de morte, que não defendo, a um assassino, parricida ou violador de crianças e autorizar ou aceitar um aborto numa mulher saudável e que desenvolve uma gravidez normal, não teria dúvidas nenhumas, nem a mínima hesitação: aceitaria mil vezes mais depressa a pena de morte para esses facínoras. Por conseguinte, o crime dos pais nada tem qualquer ligação com a defesa de uma vida que ainda está para nascer.
Mas MST é ainda mais perverso: diz que deveríamos equacionar o direito de uma criança vir ao mundo quando aquilo que a espera é uma vida indigna e miserável? Até cego só de ler isto!
Vamos lá ver: então porque é que o MST não deixa o feto desenvolver-se normamente, nascer, ser criança e, depois, ser Homem como ele e então sim, escolher sobre se preferia viver a vida miserável que, eventualmente, teria vivido ou se preferia que os pais o tivessem abortado? Quantos cidadãos portugueses, daqueles que vivem indigna e miseravelmente, optariam por não ter nascido?
Que pensaria MST se, por infelicidade ou tragédia - e ninguém está livre das tragédias que assolam este mundo (vejam os horrores da Bósnia) - os seus filhos ainda viessem a viver uma vida indigna e miserável?
Como não se lhes poderia retirar o direito de vir ao mundo, que nos proporia MST?

MST escreveu um artigo infeliz. Muito infeliz.

E eu dei por ele ontem…Era tarde. Já não poderia escrever isto antes de fechadas as urnas. Faço-o agora.

Reitor

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