domingo, 6 de janeiro de 2019

"Oxalá Portugal Tivesse Um Alberto Carvalho Como Ministro Da Educação"


«Alberto Carvalho, português por nascimento e americano por adopção, é o superintendente do ensino público em Miami. Considerando o número de alunos sob a sua alçada (cerca de 340 mil, um terço do número em Portugal) e considerando o poder de decisão que detém, Alberto Carvalho é essencialmente o ‘ministro da educação'’de um pequeno ‘país’.
Oxalá Portugal tivesse um Alberto Carvalho como ministro da Educação — por muitos motivos, mas desde logo porque ajudaria a clarificar várias confusões profundas sobre o nosso ensino básico e secundário.
A primeira confusão é a ‘equivalência’ entre ensino gratuito (garantia constitucional) e a rede de escolas públicas geridas de forma centralista e uniforme pela 5 de Outubro. Sei muito pouco sobre teoria da educação, mas sei o suficiente para compreender que alunos diferentes têm necessidades diferentes e pedem um tipo de escola diferente.
Sob a liderança de Carvalho, o sistema de ensino público em Miami desdobrou-se num largo leque de oferta: o tempo que os alunos ficam na escola, o dia em que começam as aulas, o ênfase posto nas ciências ou nas artes — enfim, tudo o que define o ‘pacote’ educativo — varia de aluno para aluno, e certamente de escola para escola. A escola pública define-se pelo conceito de acesso (gratuito), não pela solução educativa. Isto não obsta, claro está, a que haja padrões comuns de avaliação (isto é, exames comuns e exigentes): liberdade sem responsabilidade é a receita para o desastre.
A segunda confusão é a equivalência entre o sistema de cheque-ensino e o sistema de escolas com contratos de associação. Os críticos do cheque-ensino queixam-se, com algum fundamento, que o esquema aumenta a desigualdade entre ricos e pobres. Esta crítica não se aplica a um sistema ‘puro’ de escolas com contratos de associação em que a escola (de iniciativa privada) não pode cobrar propinas nem fazer seleção de alunos (quando há mais candidatos do que vagas, a seleção é aleatória).
O sistema de ensino público em Miami inclui escolas públicas bem como escolas privadas que se integram no sistema público como charter schools. Tal como noutras partes dos EUA, estas escolas têm permitido uma ‘injeção’ de inovação e ‘ar puro’ no sistema; e contribuem decisivamente para a variedade de projetos educativos a que os alunos têm acesso.
A terceira confusão — porventura a mais grave — resulta da sobreposição dos interesses especiais aos interesses dos alunos. É impressionante verificar como políticos, professores, especialistas em educação e empresários do ensino — todos manifestam uma enorme ‘paixão pela educação’; mas na verdade a grande paixão do sindicalista é a sua carreira; a grande paixão do especialista em educação é sua teoria sobre o que fazer na sala de aula; e a grande paixão do Governo é manter o controlo centralizado do sistema (por forma a maximizar a capacidade de ‘engenharia social’).
Sob a liderança de Alberto Carvalho, uma escola que receba F (a nota pior) ou muda ou fecha mesmo.
A avaliação dos professores e das escolas é um caso flagrante de conflito de interesses: nenhum encarregado de educação gosta que o filho seja ensinado por um professor certificado como inapto; mas nenhum professor (ou escola) gosta da ideia de ser avaliado. Sob a liderança de Carvalho, os professores e as escolas de Miami são avaliados regularmente; e uma escola que receba F (a nota pior) ou muda ou fecha.
Isto não é apenas uma possibilidade teórica: aconteceu com muitas escolas (e professores) até agora. (Voltando às charter schools: em média não são nem melhores nem piores do que as escolas públicas, mas têm uma grande vantagem: é muito mais fácil fechar uma charter com F do que uma escola pública com F.)
Estou certo de que Alberto Carvalho e o seu sistema têm problemas e defeitos, mas os números não enganam: em cerca de uma década Miami passou de uma péssima posição para o top 3 dos Estados Unidos (entre centenas de condados). Não é por acaso que Carvalho foi homenageado por Obama e é regularmente consultado por educadores de todo o mundo.
Oxalá Portugal tivesse um Alberto Carvalho como ministro da Educação.
Professor da Universidade de Nova Iorque e da Aese», EXPRESSO online

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